quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Aprofundando o olhar sobre os resultados do ENEM


O Exame Nacional do Ensino Médio, ENEM, é uma ferramenta importante para aprimorar a educação brasileira, não só no ensino médio, já que seus resultados refletem e dirigem ações do ensino básico e superior. No entanto, a maneira com que a mídia apresenta estes dados denota uma análise muito superficial, geralmente se limitando a apontar os "campeões" e os "atrasados" do ENEM por todo o país. Há muitos números a analisar e um estudo mais apurado pode revelar informações interessantes. Chama a atenção, por exemplo, o fato de que algumas escolas tenham tido destaque, embora tenham número reduzido de alunos. Isso reflete uma estratégia que envolve o marketing de escolas privadas tradicionais. Algumas destas simplesmente criam pequenas turmas com alunos super selecionados e tratamento diferenciado, dando a estas caráter de "escola", embora mantenham no nome algo que lhes revele a origem. O "campeão" do ENEM, o Colégio Objetivo Integração de SP, é um destes casos. E o marketing passa a ser explorado por todo o grupo Objetivo, cuja publicidade o associa como o "colégio 1o lugar do ENEM por 7 anos consecutivos". A se considerar que unidades tradicionais do Objetivo têm resultados medíocres no ENEM, isso é uma propaganda enganosa. E a prática tem se espalhado por outras cidades onde há unidades do Objetivo (como em São José dos Campos/SP). É preciso ficar atento.

Pelo visto, a seleção é fator fundamental no ENEM. O exemplo de uma escola "privada" de São José dos Campos, a "campeã" do ENEM na cidade e na região, ilustra este fator. A escola (Colégio Juarez Wanderley), mantida com recursos do Instituto Embraer, promove uma ampla seleção entre alunos da rede pública de ensino (um "vestibulinho"). Como resultado, os melhores alunos da rede pública são anualmente recrutados para a escola, que trabalha em período integral. Certamente há um aporte importante da escola durante o ensino médio, porém cabe ressaltar que lidam com o que há de melhor em termos de alunos oriundos do ensino público. Isso ajuda a lançar outra visão sobre um chavão: o de que a educação pública é pior que a privada no ensino básico. Os alunos do Colégio Juarez Wanderley, cujo resultado é o melhor do ENEM em toda a região, fizeram todo o ensino básico em escolas públicas, tendo sido posteriormente inseridos em um contexto de ensino médio diferenciado. E a regularidade com que este resultado se mantém é reflexo da consolidação do método: há sempre um degrau razoável para a escola privada que mais se aproxima, o Colégio Poliedro, referência de ensino médio privado na região e no país.

Uma outra conclusão que se pode tirar dos resultados vai na direção da comparação entre público e privado. As melhores escolas públicas regulares (excluindo as de regime especial ou associadas à universidades públicas), no caso de SP, se aproximam do segundo bloco das escolas privadas (o primeiro bloco é o que traz as escolas mais bem pontuadas e que se distanciam de todas as demais), mostrando que um pequeno aprimoramento pode guindar estas escolas para melhores resultados. E há várias escolas privadas com resultados próximos das médias de escolas públicas, mostrando que muitas escolas privadas, que cobram valores consideráveis de mensalidade, não retornam o investimento dos pais na mesma proporção. Isso é particularmente importante para aqueles pais que adotaram o jargão "escola privada é melhor que escola pública" e investem em escolas cujo rendimento é medíocre.

Enfim, há diversas outras constatações possíveis a partir de estudos mais detalhados dos resultados do ENEM e que poderiam nos dar insumos para pensar e aprimorar a educação. Muitas destas constatações podem inclusive ajudar a quebrar paradigmas quando se trata da avaliação das escolas. Importante analisar melhor os dados, tanto para os gestores públicos quanto privados, do setor educacional.